Memórias de Vida

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Janete Gonçalves dos Santos

Darvin esperava aflito no hospital por alguma notícia da esposa quando enfim o médico surgiu apressado de uma das portas. Janete havia sido internada por conta de uma hemorragia severa, diferente das outras que lhe acometiam ocasionalmente. “Ou retiramos o útero ou ela vai morrer”, afirmou o doutor estabelecendo o curso de ação.

Meses depois era Janete a aconselhar outras amigas com endometriose e dor a fazer a cirurgia e “ficar bem como ela”. Assim funcionava sua mente positiva e pragmática. No cálculo final, a infertilidade era um preço razoável a se pagar pelo fim do sofrimento e prostração. Por diversas vezes onde outros teriam se entregado vendo o corpo fraquejar, riu solto e cobriu o entorno de amor, de cuidado, e de festa.

A rotina com o marido Darvin era de cumplicidade e parceria, e planos de adoção chegaram a ser traçados, mas perderam-se em meio ao mar de sobrinhos que invadiu sua vida. Passavam de 40, a maior parte deles do lado do marido da família. Para essas crianças, e também para a meninada da rua, foi mãezona, divertida e cuidadora.

Dona de uma receita de bolo de cenoura lendária, conhecida e adorada pelos pequenos do entorno, nutria amor pela cozinha, pelas festas e reuniões de família. Nessas ocasiões, o jeito palhaço, piadista e brincalhão surgia com força total, assim como o papo fácil e a disposição quase infinita para ajudar quem precisasse.

Era sua maneira de superar, e mesmo rir, dos limites impostos pela saúde frágil. Janete tinha hipertensão e diabetes, dores frequentes de ouvido e cabeça. Depois de passar pela Souza Cruz, Tostine e KLB Group viu a carreira de auxiliar de produção encurtada com um AVC aos 52 anos.

Seguiu ativa, porém, enquanto o corpo permitiu. Ia para a missa aos domingos, e Aparecida do Norte recebia sua visita todos os anos, devota que era. Viajava quando podia: amava a praia, o campo, andar de cavalo, de bondinho.

Após o avanço da artrose e da osteoporose fraturou o fêmur e as semanas acamada se alongaram, tornaram-se anos. Não voltaria mais a andar depois disso. O câncer surgiu na garganta, mas espalhou-se mais rápido e não deu espaço e tempo para dor.

Mesmo nesses últimos momentos a mente ativa e otimista ainda sonhava em rever e cuidar da mãe, octogenária e obliviada pelo Alzheimer, em Santa Catarina. Na impossibilidade do reencontro, foi esperar por ela onde a doença e a dor não mais a alcançariam. 

1 comentário em “Janete Gonçalves dos Santos”

  1. Rosilda Crisote

    Minha mãezinha que saudades…
    Aonde vc estiver saiba que continuo cuidando do Davi como vc me pediu…
    Vc sempre estará em nossos corações te amamos muito….

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