Enquanto viveu, Ananete manteve à vista algo como um norte para os seus dias: cuidar da família e de quem mais precisasse de ajuda. E essa foi a sua missão, desde o momento em que deixou a casa dos pais para se casar em Viçosa, interior de Alagoas, ainda aos 16.
O instinto maternal já falava alto e logo os filhos vieram: entre os primeiros anos na roça e a chegada a São Paulo fugindo da seca foram 11 crianças, das quais seis sobreviveram. Para elas ela dedicou um cotidiano repleto de pequenos atos de carinho.
Na cozinha, desdobrava-se preparando a comida do dia a dia, mas também delícias como feijão de corda, bolo de fubá e doce de leite caseiro. Na máquina de costura fazia a roupa dos pequenos e depois a engomava — vestidos para as três meninas, camisas para os três rapazes —, antes de levar os filhos e seus novos trajes para a escola e para a igreja.
À frente dos rebentos, cada pequena vitória era motivo para comemoração. Foi assim quando Aparecida, a filha mais velha, voltou para casa com as mercadorias da mercearia, mas também com o dinheiro. Que orgulho perceber que a família havia conquistado o privilégio de comprar na caderneta! Com Fábio, seu marido e grande companheiro, trabalhando duro na fábrica cabia a ela garantir que no lar tudo corresse da melhor maneira.
O bom caminho para os seus era pavimentado e apontado com alegria e leveza. Certa feita, fez os filhos comerem antes em casa para não passarem vergonha no jantar na casa de uma comadre. No menu daquela noite, arroz, feijão, purê e carne moída. Momentos depois, na amiga, exatamente a mesma comida. Educadas que eram, as crianças limparam os pratos e riram da coincidência depois.
Seu impulso de cuidar não ficava restrito às crias. Ananete carregava consigo também o dom de benzer, despertado aos oito anos com a avó quando ouviu dela que tinha como missão fazer caridade até o fim da vida. Acolhia vizinhos e conhecidos em suas dores e angústias e intercedia a por eles sem nunca cobrar por isso. Familiares precisando de ajuda também sabiam poder contar com o seu teto.
A devoção a Deus era total. Ela que puxava as preces antes de todas as refeições feitas com a família. À tarde, era o terço a lhe fazer companhia e dar propósito ao passar das horas.
A vida feliz e dedicada de Ananete chegou ao fim por complicações do diabetes quando ela tinha 64. Ao sentir que não mais resistiria, um último cuidado: orientou Aparecida a olhar pelo marido e garantiu que, saindo dali, a perna não mais doeria e ela correria pelos campos. Com a partida recente de seu grande amor, ganhou companhia no passeio.